Devemos viver toda a vida em relação a Deus e reconhecê-lo em todas as coisas. Se uma pessoa está sofrendo ou em apuros, ela não deveria chafurdar em medo e autopiedade, ou confiar unicamente em recursos humanos para resgatá-la, mas deveria voltar sua mente para Deus, e orar por ajuda e libertação. E não devemos esquecê-lo se estivermos felizes e confortáveis; antes, deveríamos oferecer-lhe ações de graças e cânticos de louvor.
Então, se alguém está doente, ele deve chamar um médico imediatamente. O quê? Não é isso o que Tiago diz? Ó, ele manda chamar os presbíteros da igreja para que eles possam orar. É para orar a fim de que o homem possa suportar a enfermidade “para a glória de Deus”? Ó, ele diz para eles orarem a fim de que o homem receba a cura e para que o Senhor o levante. O seu seminário ensina isso? A sua igreja sequer permite isso?
Se uma pessoa discorda de Tiago, ou se ela amontoa desculpas para que possa ensinar algo diferente – até mesmo o exato oposto – é porque Tiago contém erros e está fora de moda, ou é porque tal pessoa está ensinando rebelião contra o Senhor? E se eu não posso orar por cura quando estou doente, por que ainda posso orar quando estou sofrendo ou em apuros? E quando estou feliz, por que deveria ainda oferecer cânticos de louvor? Tiago não faz nenhuma distinção dispensacionalista no meio de sua passagem.
O fundador de um movimento de aconselhamento bíblico reclama que os cristãos são inconsistentes quando se trata de resolver problemas espirituais ou psicológicos. Eles alegam crer na suficiência de Cristo e da Escritura, e de fato eles pelo menos tentam ser consistente quando se trata da nossa justificação diante de Deus, e dessa forma afirmamos que somos tornados justos por Jesus Cristo através do dom da fé, à parte das nossas obras e méritos. Mas então esses mesmos cristãos buscam ajuda de terapeutas e psicólogos que aconselham com base em teorias e métodos antibíblicos, a fim de resolver problemas como medo, raiva, depressão, vícios, pecados e hábitos destrutivos, e conflitos matrimoniais. Ele insiste corretamente que a Escritura é suficiente para fornecer orientações nessas áreas.
Contudo, quando ele aborda os males físicos, ou mesmo problemas psicológicos que surgem de defeitos físicos, tais como desequilíbrio químico, de repente parece que o poder de Cristo é suficiente apenas quando a questão não toca a esfera física. No momento em que suspeita-se que haja alguma base física para o sintoma psicológico, o assunto é encaminhando a um médico profissional. Ué, Jesus Cristo é bom para a alma, mas inútil para o corpo? Qual seria mais fácil dizer: “Seus pecados estão perdoados” ou “Levante-se e ande”? Mas o Filho do Homem tem poder para fazer as duas coisas.
Para adicionar hipocrisia à incredulidade, esse teólogo, esse estudioso, esse defensor da suficiência bíblica e do aconselhamento bíblico, escreve a partir de uma tradição teológica que enfatiza o governo de Deus sobre todas as coisas. Espera-se que consideremos o corpo como santo, integrante da pessoa humana assim como a alma; todavia, Deus regenerará a alma e encherá de poder divino, mas deixará o corpo aos doutores não cristãos. Confiamos em Deus para o nosso perdão, e para o nosso bem-estar pessoal, mas confiar nele para a saúde é o cúmulo da imprudência, e ensinar sobre oração para cura física é dar às pessoas falsa esperança. Que doutrina estranha é essa? Tiago não sabe nada sobre isso. Ela não procede da fé, mas da incredulidade, e do diabo.
Há argumentos que apelam à situação daqueles dias. A assistência médica era precária, onerosa e perigosa, e frequentemente associada com paganismo. Mas isso não difere fundamentalmente do cenário contemporâneo. Quantas pessoas recebem assistência médica boa, mesmo nas nações ocidentais desenvolvidas? E mesmo que você pense que os médicos possuem os próprios poderes de Deus, o que dizer sobre os milhões de pessoas que residem em outros países? A verdade é que, mesmo em nossa nação, a assistência médica é geralmente onerosa e perigosa, e os médicos são evolucionistas. A situação não mudou tanto quanto os teólogos querem acreditar. Mas mesmo supondo que a situação tenha melhorado muito, a implicação mais perturbadora permanece; é que esses teólogos desejam convencer você que Deus é sempre o último recurso, mesmo em face de um ensino bíblico explícito para buscá-lo em primeiro lugar. O que explica essa maneira desconcertante de pensar? Incredulidade.
Tudo isso não é um argumento ou proibição contra a medicina. Visto que já fiz uma declaração sobre isso em outro lugar (não existe nenhuma condenação – chame um médico, ou chame cinquenta se quiser, mas não faça de você mesmo algum tipo de herói da fé quando faz isso, e não chame a sua recuperação de um milagre), [1] eu não repetirei tudo aqui; apenas observarei que eu já refutei também a visão que por unção com óleo Tiago tencionava combinar remédio e oração (se alguém insiste em combiná-las com base nessa passagem, então ele pode mandar os presbíteros da igreja realizar as cirurgias, ou então abandonar o fingimento e admitir que ele deseja afirmar uma visão alternativa, mudando apenas o que ele deseja mudar, reivindicando em todo tempo suporte bíblico). Antes, estou insistindo que, a menos que haja um argumento infalível e bíblico para agir de outra forma, não há razão para anular um mandamento explícito na Escritura, e aqui isso significa que os líderes da igreja devem orar com fé para a cura do seu povo. Nenhuma manobra histórico-redentiva pode fazer este texto significar o oposto do que ele diz. Ou você crê nele e obedece, ou não.
Quanto ao método, embora Tiago diga que os presbíteros deveriam ungir o doente com óleo, entende-se que essa não é a única maneira. É sem dúvida uma maneira, e aceitável, e deveria ser seguida quando a atenção de alguém está focada sobre este texto. Mas a Escritura mostra que a cura é efetuada por imposição de mãos, e por oração ou palavra de mandamento sem qualquer contato físico. Há muita liberdade e poder em Jesus Cristo.
A coisa essencial é a fé. É fácil pronunciar uma oração de dúvida e incredulidade quando a pessoa crê em nada, nada espera, nada pede e nada recebe. Mas não vamos nos contentar com aquilo que é natural para o velho homem, cheio de pecado. Não sejamos meros ouvintes da palavra, e assim nos enganarmos, mas sejamos praticantes da palavra também. Vivamos verdadeiramente tudo da vida em relação a Deus e o reconheçamos em todas as coisas, mesmo quando se trata da saúde dos nossos corpos. E quer chamemos ou não médicos, quando falharmos em orar com fé ou quando nossa oração não trouxer cura, admitamos nossa falha e imploremos por graça, em vez de continuar num estado de ilusão. Sem dúvida reconhecemos a soberania de Deus, mas a Bíblia nunca usa isso para escusar a incredulidade. A pior coisa que podemos fazer é justificar a nós mesmos condenando Tiago à irrelevância.
Fonte: Sermonettes, Volume 4, p. 32-34
Tradução: Felipe Sabino de Araújo Neto – novembro/2011
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